Escritos e publicações

  • Psicanálise
  • Sonhos

    É preciso sonhar. No entanto, se vê hoje em dia uma quantidade enorme de pessoas que reclamam: não consigo dormir. Não tem sonho sem sono, né, e aí a gente já percebe que o mundo está cheio de gente que também não sonha. Gente que abandonou seus sonhos.

    É com você que estou falando? Espero que não. Sonhar é importante, e faz tempo que a gente sabe disso. Tanto que sonhar nem significa mais só aquela experiência durante o sono, em que imaginamos (alucinamos?) que estamos vivendo coisas, muitas vezes absurdas, para depois acordar e descobrir que era só sonho. Sonhar ganhou status de querer, ansiar, desejar muito alguma coisa. Já parou pra pensar no porquê disso?

    Eu tenho uma relação antiga com sonhos. Aliás, um fato sobre mim: me aproximei da psicologia e consequentemente da psicanálise por causa de um sonho (desses do sono, não do outro tipo). Olha aonde isso me trouxe. E tem gente que não dá valor para seus sonhos. “Só sonho um monte de coisa maluca” ou “só sonho um monte de coisa boba”. Queria ganhar um sonho para cada vez que escuto isso. Falo agora, claro, dos da padaria.

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  • Dopamina

    Eu estava em busca de um tema sobre o qual escrever. Minha ideia, aqui, é escrever de forma regular sobre assuntos que tenham intersecção com psicanálise ou, de forma mais ampla, que se relacionem com saúde mental. Pretendo também, embora não seja uma regra, que os textos tragam questões cotidianas. É um desafio que me impus. Preferia fazer isso num blog, ou algo parecido: aqui existe uma limitação de tamanho que me chateia. Mas fora daqui vocês não leriam, a moda é o Instagram. Sei porque eu também não leio. Vivemos no Instagram. Pois bem.

    Essa introdução já suscita um assunto óbvio: redes sociais. É claro, desde o Orkut nossa vida na internet gira em torno das redes sociais. Os mais novos aqui talvez nem tenham conhecido o Orkut. Os ainda mais novos, nem o Facebook. Me pergunto quando superaremos o Insta. Faz parte, o tempo passa. Mas divago. Redes sociais, como assunto, são um prato cheio para quem quer escrever sobre comportamento e saúde mental. E os psis, claro, assim como eu agora, aproveitam. Pululam nas próprias redes textos denunciando os efeitos nocivos que elas podem ter, e de fato têm, sobre a saúde mental das pessoas.

    Sabemos, mesmo quem não é da área sabe, até sobre como nos tornamos dependentes das pequenas doses de dopamina que cada curtida ou outra interação positiva traz, provocando prazer, e sobre como essa dependência nos afasta da realidade e nos mantém refém das telas. Temos consciência da ansiedade que provoca a ideia vendida nas redes de que a vida tem que ser sempre interessante e “instagramável”. Está claro para todos como os algoritmos tendenciosos nos prendem em bolhas ideológicas que nos impedem de ter contato com o diferente, nos tornando intolerantes, além de nos segmentarem, transformando-nos em um grande mercado para a propaganda manipuladora.

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  • Fake

    Fake agora é moda. Corrijo: já faz um bom tempo. Mas o termo se tornou mais popular recentemente. Mentira deixou de ser mentira — agora é fake news. O sujeito faz uma conta na rede social com nome e foto falsa para bisbilhotar a vida a vida alheia: fez um fake. A pessoa compra uma bolsa Lui Vitão, ou um tênis da Naike; tá na cara que é fake. Até os golpistas agora se passam por alguém que não são nas redes, um perfil fake. Aliás, aconteceu comigo esses dias: quando vi, tinha outro Caio Conechoni importunando meus contatos por aí. Me senti importante.

    Estou surpreso, aliás, que fake ainda não virou diagnóstico. Síndrome do membro fantasma? Síndrome do membro fake. Alucinação não-psicótica, conhecida como pseudoalucinação? Alucinação fake. Imagina a pseudociese, a tal da gravidez psicológica? Ora, é fake. Por falar nisso, acho curiosa essa associação do psicológico com o fake. Porque é psicológico, deve ser fake. Até escuto o fulano dizendo “isso aí não é nada, é só psicológico” como quem diz “isso não é nada, é fake”.

    Os psicólogos ficam loucos com isso. Os psiquiatras, suponho, também não gostam. É claro, estas categorias dependem da realidade daquilo que é psicológico. Se não for assim, psiquiatra pode ser substituído por neurologista. E psicólogo por… por quê? Mas vou dizer um negócio importante, tanto que vou até destacar em um parágrafo exclusivo:

    Você é meio fake.

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  • Não-saber

    Para os leigos, os civis, os ordinários, os comuns, aqueles que não foram iniciados nas belezas e nos mistérios do mundo psi, encontrar um psicanalista quase sempre acontece de forma desavisada. O sujeito vai atrás de um psicólogo, ou de um “terapeuta”, procura, escolhe, investiga, e acaba nas mãos de um psicanalista. Não é um grande problema; nem sempre o que a gente tá procurando é o que a gente precisa. Mas, desavisada que está, a pessoa que de repente se vê de frente a um psicanalista sem ter se preparado para isso, muitas vezes leva um susto.

    A treta é a seguinte: o mundo hoje funciona de um jeito que é muito diferente de uma análise. No mundo de hoje, tem jeito certo pra quase tudo. Tem sempre um especialista na TV ou nos reels dizendo “coma isso, não coma aquilo”, “faça esse exercício”, “leia aquele livro”, “transe desse jeito”, “se relacione assim ou assado”. E tem sempre alguém pra dizer pra pessoa que ela tá errada, mesmo quando ela faz tudo como mandam os especialistas.

    O analista não é um especialista (aliás, aviso: encontrou um analista que se diz especialista, desconfie). Um psicólogo pode ser, um analista não. O lugar do analista é o lugar do não-saber: é o lugar da interrogação. Não espere de um psicanalista que ele te oriente como fazer alguma coisa, ou te dê instruções, dicas, conselhos, a respeito de seus problemas. Não vai rolar, porque não pode rolar. Já tá cheio de gente disposta a fazer isso por aí. O analista quer de você outra coisa — ele quer que você se questione sobre o que fica fora do discurso pronto, arrumadinho. Sabe aquela coisa de chegar na frente do analista e começar a contar toda aquela história ensaiadinha? O analista, o bom analista, tem o dever de quebrar essa historinha, e apontar pra onde está o furo dela.

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  • Fala!

    Tu tens grandes projetos, planos, ambições. Mas estás sempre meio ficando para trás, meio deixado de lado, meio te sentindo irrelevante. Tu sabes que tem boas ideias, e sentes que tem algo a dizer de interessante, mas tua boca tá sempre fechada, e teus pensamentos estão sempre guardados. “Um dia”, “logo logo”. E o dia não chega. E a boca não abre.

    E o sentimento sempre te acompanha: “minha hora ainda vai chegar”. Mas os minutos vão passando, as horas se sucedem, os dias viram noites. Tu te empolgas com alguma novidade, com um trabalho novo, com a agitação de qualquer começo. E logo, descobres, era fogo de palha. O tesão sumiu, e ficou só mais uma coisa começada. E a sensação de que tu podias ter feito mais.

    Podias? Por que não fizeste?

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  • O aniversário de Sigmund Freud

    Sigmund Freud é o nome do descobridor do inconsciente e fundador da psicanálise. Ele nasceu em 06 de maio de 1856, na Morávia, região da Europa que na época pertencia ao Império Austríaco, e que atualmente faz parte da República Tcheca. Hoje, 06 de maio de 2019, comemoramos portanto 163 anos de seu nascimento. Mas, por que comemorar? Ora, comemora-se aquilo que trouxe algo de positivo para o mundo ou para a vida das pessoas. E sim, sem dúvida, há motivos para comemorar quando nos atentamos à vasta obra que Freud produziu em vida, cuja origem remonta à última década do século 19 e cujo fim só de dá com sua morte em 1939. Essa obra, literária e teórica, permaneceu viva muito após o falecimento de seu criador, e segue deixando uma marca no mundo como faz desde seu surgimento. Freud foi muito relevante no início século 20, e continua relevante hoje, às vésperas da terceira década do século 21.

    A relevância da psicanálise atesta-se por sua história. Ela surgiu como resultado do trabalho de Freud como médico na cidade de Viena, onde morou por quase toda sua vida. Freud era neurologista por formação e se interessou no início da carreira pelas doenças chamadas “nervosas”, cujos sintomas eram bastante evidentes mas as causas e os processos de cura ainda eram bastante misteriosos. O exemplo mais clássico dessas doenças é a histeria, afecção em que a pessoa era acometida em seu corpo por sintomas diversos como paralisias, tremores, desmaios ou dores, por exemplo, sem que houvesse uma razão clara para o surgimento desses sintomas, como uma infecção, um traumatismo, uma falência de órgão ou algo do gênero. Outro exemplo eram as neuroses obsessivas, cujos afetados por ela tinham sintomas parecidos com o que hoje se convencionou chamar de Transtorno Obsessivo Compulsivo: a incidência de medos e pensamentos ruins cuja evitação se busca por meio de ações e comportamentos que muitas vezes trazem muito sofrimento, e cujas relações com esses pensamentos não estão sempre claras.

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